Papa Francisco (1936-2025): O Legado da Fraternidade
O mundo despede-se hoje de uma figura que marcou profundamente a história contemporânea da Igreja e da humanidade. Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco, faleceu a 21 de abril de 2025, às 7h35, deixando um legado incontornável de esperança, proximidade e compromisso com os mais vulneráveis.

Alexandre Nuno Teixeira é Gestor de Programas no Setor Social (Migrações) e Dirigente Associativo Voluntário (Movimento Associativo Popular e IPSS).
Foi o primeiro Papa jesuíta, o primeiro oriundo da América Latina e o primeiro a adotar o nome de Francisco — em homenagem a São Francisco de Assis, símbolo de pobreza, paz e cuidado com toda a criação.
Entre as muitas contribuições do seu pontificado, Fratelli tutti, encíclica publicada em 2020, destaca-se como o coração do seu pensamento social e espiritual. Um verdadeiro manifesto à fraternidade universal e à amizade social, que agora ressoa com ainda maior intensidade, como testamento espiritual de quem fez da empatia a sua bandeira.
Fraternidade Universal: um sonho sem fronteiras
Francisco foi, acima de tudo, um construtor de pontes. Num mundo cada vez mais dividido, o Papa insistiu que a humanidade só teria futuro se reconhecesse o outro como irmão. Não apenas o vizinho ou o compatriota, mas o migrante, o muçulmano, o agnóstico, o pobre, o prisioneiro, o diferente. Para ele, a fraternidade não era uma palavra bonita — era um imperativo ético e espiritual.
Com coragem e humildade, apelou à união dos povos, sublinhando que só uma fraternidade verdadeiramente universal poderia curar as feridas profundas do nosso tempo: a desigualdade, o racismo, a xenofobia e a exclusão social.
Contra o individualismo e a indiferença
Na sua crítica contundente à cultura do descarte, o Papa Francisco desafiou um sistema económico e cultural marcado pelo egoísmo, pelo consumo desenfreado e pela indiferença. Enfrentou com firmeza os interesses que colocam o lucro acima da vida, denunciando as injustiças que condenam milhões à invisibilidade.
Para Francisco, a dignidade humana nunca foi negociável. E isso ficou evidente na sua opção preferencial pelos pobres, pelos idosos esquecidos, pelos povos indígenas, pelos migrantes em fuga de guerras e miséria. Ensinou-nos que a indiferença é o maior pecado dos nossos tempos — e que ninguém se salva sozinho.
O Bom Samaritano como modelo de humanidade
Ao recorrer à parábola do Bom Samaritano, Francisco ofereceu-nos não apenas uma imagem, mas um programa de vida. A sua mensagem era simples e profunda: não basta passar ao lado do sofrimento. É preciso parar, cuidar, envolver-se.
Na sua visão, todos nós — cidadãos, líderes, instituições — somos chamados a agir com compaixão. A dor do outro deve incomodar-nos, mobilizar-nos, interpelar-nos. Só assim poderemos construir uma sociedade onde a solidariedade não seja exceção, mas regra.
Política como expressão de amor social
Francisco não teve medo de falar de política. Mas não o fez com partidarismos: falou da boa política, aquela que nasce do amor ao próximo e do desejo sincero de servir. Rejeitou tanto os populismos demagógicos como os liberalismos que promovem a indiferença social.
Apelou a uma política com rosto humano, centrada no bem comum, que proteja os mais frágeis e que coloque a ética no centro da governação. Defendeu um novo pacto social e económico, mais justo, mais inclusivo, mais sustentável.
O diálogo como caminho de paz
Num tempo de muros, Francisco pregou o diálogo. Entre religiões, entre culturas, entre gerações. Convicto de que a escuta é a chave para a reconciliação, promoveu encontros inéditos com líderes muçulmanos, judeus, ortodoxos e ateus. A sua assinatura no Documento sobre a Fraternidade Humana, com o Grande Imã de Al-Azhar, foi um marco histórico.
Para o Papa, o diálogo era mais do que uma estratégia — era uma expressão do amor. Um convite permanente à construção de pontes, à busca de consensos e ao respeito pelas diferenças.
Com a morte de Francisco, o mundo perde um pastor próximo, um líder espiritual visionário e uma voz firme contra a desigualdade e a exclusão. Mas o seu legado permanece — nas palavras que escreveu, nas causas que abraçou, nas sementes que lançou nos corações de milhões.
Como ele próprio disse: “Sonhemos como uma só humanidade, como viajantes feitos da mesma carne humana, como filhos desta mesma terra que nos acolhe a todos.”
Hoje, mais do que nunca, somos todos chamados a continuar esse sonho.
Fratelli tutti, sempre!
22/04/2025
A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.